sábado, 5 de novembro de 2011

Capítulo 4: Culto dos Mortos nas várias culturas e nos diferentes PovosCulto dos Fiéis Defuntos (cont.)

5- Na Índia
6- Entre os Gregos
7- Entre os Romanos
8- Na Península Ibérica
9- Entre os Japoneses
10- Entre os Chineses (Confucionismo e Taoísmo)
11- Entre os Mexicanos
12- Entre os Mukulu Bantu (Angola - África)
13- Conclusão geral
14- Bibliografia
Na Índia


Na Índia, o culto prestado aos Antepassados encontra-se atestado nos Hinos do Rig-Veda (os Livros das Leis de Manu), mas é aceite comummente de que tal prática se encontrava presente nas sociedads Hindus anteriores, como, por exemplo, nos grupos que seguiam já a Religião do Brama, considerada muito anterior à redacção desses Hinos.
Nas Leis de Manu (I, 95; III,122, etc.) preceituava-se a oferta da refeição chamada sradha que consistia na oferta de arroz e era dirigida pelo chefe da casa (sraddha).
Esta carinhosa oferta deveria ser feita regularmente, de modo a que todos se sentissem felizes, pois, acreditava-se que os espíritos dos antepassados vinham assistir a esse banquete e que tal participação lhes concedia alegria e paz[1].
À semelhança dos Gregos, os Hindus consideravam os Mortos seres divinizados, mas que necessitavam de oferendas dos Vivos as quais deveriam ser feitas regularmente de modo a sentirem-se felizes e que sem elas sairiam dos túmulos, tornando-se errantes e atormentadores dos Vivos[2].


6- Entre os Gregos
Na Grécia pré-homérica e antes de ali se fixarem os povos indo-europeus, cuja presença teve lugar por volta do século VIII (a. C.) os seus habitantes encontravam-se agrupados em grupos de maior ou menor dimensão aos quais se dava o nome genérico de Genos. Todos esses Genos obedeciam a um chefe ou Patriarca (“Pater famílias”) ao qual cabia a função, não só de administrar a justiça cujas leis se baseavam nos costumes ancestrais, mas também a de dirigir o culto prestado aos antepassados.
Tudo, nesse Genos, era colectivo: propriedades, rebanhos, inclusivamente o trabalho que era feito em prol do grupo. Como a economia grupal se baseava na agricultura e na pastorícia, nenhuma parte dessas duas possessões, ou parte delas, podiam ser alienadas sem razões plausíveis e sem o acordo de todos os seus membros. Se o trabalho a ser realizado era distribuído em iguais condições, o fruto desse era, também, repartido equitativamente, o que impedia diferenças no amontoar de riquezas, por quem quer que fosse ou pertencesse ao grupo (belo exemplo para as nossas sociedades modernas!).
O que sobrava da divisão desses bens era aplicado no enriquecimento geral e colectivo do grupo, sendo aplicado na compra de escravos (mão-de-obra), na contratação de artífices pertencentes a outros Genos e na aquisição de mercadorias que revertiam a favor do tesouro colectivo[3].
No tempo da Tirania, na Grécia, sistema que, proveniente da Ásia, foi introduzido na Grécia a partir do século Vl a.C , o exercício do poder tomou uma forma autocrática, passando a ser exercido por um só indivíduo com poderes absolutos e sobre um ou vários Genos, não tendo a palavra “tirania”, na altura, o sentido pejorativo que viria a tomar mais tarde. Esse sistema tirânico grego representava, também, os interesses colectivos[4].
Posteriormente, a partir do século VIII (a.C.), deu-se a desintegração desses Genos, provocada pelo “crescimento populacional e pelo aumento do consumo”[5], o que veio, consequentemente, a modificar-se a estrutura social. Ao colectivismo, sucedeu a distribuição da propriedade de modo desigual e injusto, porquanto “As melhores parcelas de terra foram tomadas pelos parentes próximos do pater, e por esse motivo, passaram a ser chamados de eupátridas (“bem-nascidos”).



O restante das terras foi dividido entre os georgóis (agricultores), parentes mais distantes do patriarca. Nesse processo de divisão, os mais prejudicados foram os thetas (marginais), para os quais nada restou”. Desta nova sociedade fez surgir a Basliseu (Βασιλεύς) a ideia da formação de do Demos (“Povo” ou “Povoado”) que se desenvolveria até chegar à formação de uma sólida agregação das várias Tribos (Ibidem).
Neste período (tempo de Εὐριπίδης c. 480-406 e de Σωκράτης, 469–399) deu-se um grande incremento do racionalismo filosófico, que foi acompanhado por um crescimento paralelo de uma teologia alimentada por movimentos religiosos que era caracterizada pela crença na imortalidade da alma e pelas ideias escatológicas e que os mais dedicados à espiritualidade apelidaram de "Mistérios" (palavra proveniente do grego mysterion, por sua vez, de do verbo mýein “fechar, calar-se” que passou a significar “fechar a boca” e mýstes “que se fecha” e veio a originar a ideia de algo secreto) o que se apropriava a todo o iniciado que quisesse entrar num determinado movimento religioso ou espiritual.
O culto aos antepassados, porém, nem por isso sofreu qualquer interrupção, antes pelo contrário se arraigou ainda mais nas camadas sociais, surgindo e desenvolvendo-se uma espécie de catecumenato ao qual eram admitidos todos aqueles que desejavam pertencer a essa “irmandade”, emergindo, por isso, o que veio a chamar-se o ritual de “Iniciação”, considerando-se a doutrina ali ensinada e aprendida “Ensinamentos Exotéricos”[6]. Para o desenvolvimento destes ensinamentos muito viriam a contribuir as doutrinas de origem Frígia e Síria com a aceitação da Grande Mãe (Deusa-Terra) que os Gregos vieram a chamar Geia ou Gaia[7] e que, segundo a Teogonia de Hesíodo (126sq.), gerou Urano, que, por sua vez, gerou dela Doze Titãs (Oceano, Keos, Crio, Hiperião, Jápeto, Teia, Reia, Témis, Mnemosine, Febe, Tétis, Knonos) dos quais surgiram outros deuses gregos. Sobre o aparecimento dos deuses gregos existem outras histórias que podem ser lidas no seguinte site: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/MGGaia00 .html.
A denominação que os Gregos davam aos seus Antepassados defuntos estava relacionada com a condição em que se encontravam, ou seja, deuses subterrâneos. Em Ésquilo, um filho invoca deste modo o pai morto: “Tu, que és um deus debaixo da terra, sê-me propício”, enquanto Eurípides, ao falar do túmulo de Alceste[8], diz: “Junto a seu túmulo o viandante há de parar, e dizer: Esta é agora uma divindade feliz[9].
Quanto aos costumes fúnebres[10] mais frequentes ou comuns, tanto entre os Gregos, como entre os Romanos contavam-se os seguintes:
· Escrevia-se um epitáfio (… que ali repousava X…),
· Derramava-se vinho sobre a tumba para matar a sua sede;
· Depositavam-se alimentos para matar a sua fome;
· Sacrificavam-se cavalos e escravos que o tinham servido para continuarem a servi-lo;
· Negar a sepultura a alguém, seria torná-lo miserável.
Acreditava-se entre os Gregos que tais oferendas (sacrifícios, alimentos, libações) faziam com que os espíritos dos antepassados voltassem ao túmulo e, com estas oferendas, encontrassem alívio e se irmanassem nas características[11], passando a receber os nomes ou títulos de demónios ou de heróis[12].
Por sua vez, os Romanos deram-lhe os nomes de Lares, Manes[13] ou Génios. Assim o afirmava o filósofo e escritor satírico romano Lucius Apuleius (125 – 164 d.C.) quando dizia: “Nossos antepassados acreditaram que os manes, quando maus, deviam ser chamados de larvas, e de Lares quando eram benfazejos e propícios”[14], ou, ainda: “Génio ou Lar, trata-se do mesmo ser; assim o creram nossos antepassados”[15]. Esta mesma ideia se encontra em Marcus Tullius Cicero (sɪsɨr/; Classical Latin: [ˈkɪkɛro’] (106-43 a.C.); que, ao concordar com os Gregos, dizia: “Aqueles que os gregos chamam demónios nós chamamos Lares[16]”.



Se, por outro lado, os humanos deixassem de fazer essas oferendas, os Mortos sairia dos túmulos e, como “sombras errantes” gritariam durante a noite assombrada, como que a censurar e castigar essa negligência imperdoável[17].
7- Entre os Romanos



Desde que o morto tinha necessidade de alimento e de bebida, pensou-se que era dever dos vivos satisfazer às suas necessidades. Para isso o próprio Direito Romano consagrou-lhe alguns artigos a serem observados pela comunidade romana[18].
Estabeleceu-se, desse modo, uma verdadeira religião da morte, cujos dogmas logo se reduziram a nada, mas cujos ritos duraram até o triunfo do Cristianismo;
Os mortos eram considerados criaturas sagradas[19]. Os antigos davam-lhes os epítetos mais respeitosos que podiam encontrar; chamavam-nos de bons, de santos, de bem-aventurados[20]. Tinham por eles toda a veneração que o homem pode ter para com a divindade, que ama e teme.



Segundo o seu modo de pensar, cada morto era um deus[21].
Essa espécie de apoteose não era privilégio dos grandes homens; não se faziam distinções entre os mortos. Cícero afirma: “Nossos ancestrais quiseram que os homens que deixaram de viver fossem contados entre os deuses[22].” — Não era necessário ter sido um homem virtuoso; o mau tornava-se deus tanto quanto o homem de bem; apenas continuava, nessa segunda existência, com todas as más inclinações que tinha tido na primeira[23].
Os romanos davam aos mortos o nome de deuses manes: “Prestai aos deuses manes as honras que lhes são devidas — diz Cícero — pois são homens que deixaram de viver; reverenciai-os como criaturas divinas[24].”
Os túmulos eram os templos dessas divindades. Assim exibiam eles, em latim e em grego, a inscrição sacramental: Dis Manibus, theõis ethoníois. — Era lá que o deus permanecia sepultado: Manesque sepulti — diz Virgílio[25]. Diante do túmulo havia um altar para os sacrifícios, como diante do túmulo dos deuses[26].



Um túmulo estava isento da lei do Usucapião, por ser uma morada própria (10ª tábua da Lex Duodecim Tabularum, também conhecida pela forma abreviada de Duodecim Tabulae); estas 12 Tábuas ou Códigos que formavam a essência da Constituição da República Romana e dos Costumes dos Antepassados (Mos Maiorum) foram escritas entre os anos 451 (as dez primeiras) e 450 a.C. (as outras duas).

Estas mesmas viriam a constituir o fundamento do posterior Direito Romano que, por sua vez, serviu de base aos Códigos Jurídicos de todo o Ocidente. Infelizmente estas Tábuas perderam-se durante o incêndio que os Gauleses atearam a Roma no ano 390 a.C.
7.1- Conteúdo genérico das XII Tábuas.

· Tábuas I e II: Organização e procedimento judicial;
· Tábua III - Normas contra os inadimplentes (não cumpridor dos compromissos);
· Tábua IV - Pátrio poder;
· Tábua V - Sucessões e tutela;
· Tábua VI - Propriedade;
· Tábua VII - Servidões;
· Tábua VIII - Dos delitos;
· Tábua IX - Direito público;
· Tábua X - Direito sagrado; Tábuas XI e XII – Complementares.






Raven Luques McMorrigú num artigo denominado “Altares Domésticos…” que publicou na secção Ibéria Aeterna[27] afirma :
Desde os nossos mais remotos Ancestrais, há a noção da importância não só física, como também mágico-psíquica do Fogo....seja a Fogueira, a Lareira, o Altar, o Fogão....ao redor do Fogo, Vida e Morte falaram de suas múltiplas facetas.......ao redor do Fogo, as Artes de preparar alimentos, remédios, artes e artesanatos, metalurgia e escultura se desenvolveram.....assim como também as Artes de criar cantos e contos que alimentam e curam a mente e o espírito.....
Com o passar dos séculos, o Fogo Doméstico, eixo nuclear do Clã, foi cada vez mais envolto em simbolismos e conceitos que remetem ao Sagrado. Tornou-se, entre os Ibéricos antigos, o Altar dos Ancestrais: o ponto focal simbólico da Espiritualidade Tradicional de nossos Ancestrais, e local onde a Tradição era repassada às novas gerações...



Outro exemplo do culto prestado aos mortos na Península Ibérica é a abundância dos monumentos megalíticos que encontramos em toda a parte, nomeadamente no solo português. Ora, é por demais sabido que tais monumentos serviram de sepulturas aos mortos e que era costume utilizarem-se, nos primórdios, tumbas colectivas, que são, hoje apelidadas de Antas ou Dólmenes.
9- Entre os Japoneses



Embora as práticas Xintoístas tenham sido codificadas em “Escrituras Sagradas” (Kojiki e Nihon Shoki) somente entre os séculos VII e VIII d. C., a Religião própria dos Grupos Japoneses primitivos era caracterizada por um culto que acompanhava a mudança das Estações do ano, sobressaindo as festas das colheitas e uma Cosmogonia e Mitologia exclusivamente japonesas que se fundamentavam nas tradições espirituais das culturas Yamato e Izumo, onde se adoravam os Kami (神) que poderemos traduzir na nossa língua por “espíritos” ou “divindades” e que podem ser elementos da natureza, como por exemplo, as “Montanhas Sagradas”(animismo), divindades, onde sobressai a deusa Amaterasu (politeísmo) ou os próprios imperadores, tornados divindades, principalmente depois da morte, como aconteceu com o imperador Hachiman.



Estes espíritos são representados pelos Japoneses através de objectos domésticos (um espelho, um prato, etc.) ou por outra qualquer representação, mais ao gosto das populações (espécie de andores, por exemplo), ou por pinturas como aquela de Morikami (1679-1748)[28].



O Xintoísmo moderno, embora possua um sistema teológico com uma autoridade central, não defende, nem pratica uma “teocracia única e exclusiva” e encontra-se um sincretismo religioso bastante grande, onde se fundem elementos budistas, confucionistas, taoistas e cristãos, à mistura com elementos xintoístas.
Este mesmo sincretismo pode encontrar-se nas comunidades japonesas da diáspora, nomeadamente na pequena cidade de Assai, situada no Paraná, como o atesta ANDRÉ, R. G na sua tese de doutoramento que defendeu em (2008), ilustrando-a com fotografias que foram reutilizadas pelo professor da Universidade Estadual de Maringá, Richard Gonçalves André, no seu trabalho "O Sagrado Evanescente: Análise da Religiosidade Nikkei por Intermédio de Sepulturas no Cemitério de Assaí (1932 – 1950)"[29] no qual analisa as representações e práticas mortuárias entre japoneses e descendentes em Assaí (Paraná) entre os anos 1932 e 1950, tendo, como fontes, sepulturas existentes no cemitério desse município.



10- Entre os Chineses (Confucionismo e Taoísmo)
Além de serem frequentes as práticas dos exorcismos, encontrava-se também muito arraigada a prática do culto prestado aos Antepassados, sendo inculcada, tanto no Confucionismo como no Taoísmo que são os dois exemplos mais claros das filosofias da Antiga China. Também, aqui, se acreditava que os Antepassados (Defuntos) poderiam influenciar, ajudar e iluminar os imperadores, governantes e o povo, tornando-se, por isso, prática comum, tanto entre o Povo como entre os imperadores e ministros imperiais.
Este dever não foi criado por Confúcio[30], mas apenas relembrado e inculcado como sendo uma consequência lógica do dever da “piedade filial”. Esse dever tão acarinhado e praticado entre os chineses, enquanto os pais viviam, deveria ser continuado mesmo depois da morte.
Para que tudo se processasse de acordo com as tradições e as crenças populares e imperiais, deveriam, todos, fazer-lhes as suas oferendas que, normalmente, consistiam em: alimentos, bebidas, armas de guerra e outros utensílios que eram diariamente utilizados por esses Antepassados.
Baseada nesta moral chinesa muito antiga, grandes correntes filosóficas cuja fundação data, mais ou menos, do ano 517 a.C tem sido atribuída a dois grandes homens – Lao-Tsze (-570 - 490 +-) e Confúcio (551 a.C. - 479 a.C+-), a partir dos quais se difundiu por todas as regiões da China e fora desta.
É de notar que Lao-Tszé, embora pertença ao mesmo século, é mais velho do que Confúcio (cerca de 40 anos), mas conheceram-se e discutiram seus próprios pontos de vista (Potter, 1937, p. 193).
Lao-Tszé, que viveu 4 séculos antes de Jesus Cristo, ensinou uma doutrina, semelhante à deste no que diz respeito à máxima: “paga o mal com o bem”.



Lao-Tszé dizia:
“Para aqueles que são bons comigo, eu serei bom.
Para aqueles que não forem bons para comigo,
eu serei bom também.
E, assim, tudo se tornará bom"[31].
“Recompensa a injúria com a gentileza”[32].



Cristo, por seu lado, veio também dizer:



Ouvistes o que foi dito:
Amarás o teu próximo



e odiarás o teu inimigo.
Eu, porém, digo-vos:
Amai os vossos inimigos,
Fazei bem aos que vos odeiam,
Orai pelos que vos perseguem e caluniam,
Para que sejais filhos do vosso Pai que está nos céus” (Mt. 5, 43-449[33].



Contrariamente, Confúcio não concordou com ele e susteve o princípio da reciprocidade, dizendo: “Recompensa a injúria com a justiça,
Recompensa a gentileza com a gentileza”[34].
Datas propícias para as oferendas
A data principal era aquela em que se celebrava a Festa da Pureza que caía por volta do mês de Abril. Nesta Festa celebravam-se os antepassados, fazendo-lhes ofertas de bens materiais, como também se renovavam os seus túmulos. Cada ano, por volta do dia 5 de Abril, celebrava-se a Festa da Pureza e Serenidade. Tratava-se de uma ocasião para oferendas aos antepassados, e também para renovar os túmulos. Era propícia para se realizar essa comemoração vista ser um tempo agradável, brotando verdura e flores e ser um tempo propício para as pessoas darem umas voltas pelos campos verdejante. Por esta razão chamou-se a essa festa a "Festa de Pisar o Verde"[35].
É prática ainda hoje existente, em Macau, Hong Kong e na China continental, contando-se entre essas práticas, o célebre Festival dos Fantasmas, ou Espíritos Famintos. Tais costumes, se por um lado, incutem nos Vivos, um certo respeito e medo, por outro lado dão-lhes um certo consolo e alívio no seu dia-a-dia[36].
11- Entre os Mexicanos



Também no México se celebra o Dia dos Mortos e este costume remonta à Civilização Maia que ocupou esse território cerca de 3.000 anos antes da chegada e conquista dos Espanhóis. Tinha lugar, normalmente, no mês de Agosto, era presidida pela Deusa Mictecacíhuatl, ou “Dama da Morte” e era dedicada às crianças e parentes falecidos.
Os próprios Azetecas, que, à data da chegada dos Espanhóis, se encontravam no poder, embora também ali existissem outros povos, como os Toltecas, Olmecas, Purépechas, Tarahumaras e Tojolabales, viram-se obrigados a adaptar ao Cristianismo, ora introduzido, tanto os seus ritos e a sua maneira de se relacionar com os mortos e com a morte, como também o conjunto das crenças e da doutrina religiosa, na sua própria substância. Não deixaram, porém, de conservar, evidentemente, muitas das formas e crenças ancestrais, procedendo a um certo sincretismo religioso. Assim, permaneceu, sempre entre os “Conquistados” e seus descendentes aquela relação de respeito, alegria, fascínio e de intimidade que inebriava a celebração ancestral do Dia dos Mortos[37].
Por isso, em vez do mês de Agosto, passaram essa Comemoração para os finais de Outubro, princípios de Novembro a fim de se adaptarem aos costumes espanhóis e católicos, mas, não eliminaram as oferendas de comida, nem a música, a luz, as cores, nem tão pouco a crença de que os seus parentes e amigos defuntos devessem voltar à terra[38], ideia que, aliás, se harmonizava com a doutrina católica da Ressurreição.
Verdadeiramente, muitas das oferendas que ainda agora são levadas aos túmulos dos antepassados, tais como: “doces; círios aos pares em forma de cruz para mostrar o caminho às almas; velas que simbolizam a luz do sol; crisântemos amarelos; cruzes de terra que simbolizam o pó em que o defunto se tornará; coroas de flores; velas;pães com formatos, formas e figuras diferentes; alimentos que a pessoa falecida gostava em vida, bem como objectos pessoais e brinquedos no caso de se venerar uma criança”[39] simbolizam realidades bem conhecidas, ensinadas e praticada pelos fiéis católicos, como o poderemos presenciar nas nossas igrejas (onde se lembra que o homem é pó e que em pó se há-de tornar) e nos nossos cemitérios, onde costumamos ir em romaria de saudade no dia 1 de Novembro ou “Dia de Todos os Santos” (que, além de englobar todos os nossos Antepassados que consideramos terem morrido na paz de Deus, tem sido, até este ano, um Dia Feriado), embora o dia próprio dos “Fiéis Defuntos se celebre oficialmente no dia 2 de Novembro.
A grande familiaridade que os Mexicanos nutrem para com os seus mortos é maifestada no seu quotidiano, utilizando caveiras nos seus automóveis e em muitos nomes toponímicos, como por exemplo: Calzada del Hueso, Barranca del Muerto, Calle de la Muerte, como muito bem o notou e descreveu Simone Andréa Carvalho da Silva[40] num artigo que escreveu após uma visita ao México e que intitulou "Festa dos Mortos para Celebrar a Vida".
12- Entre os Mukulu Bantu (Angola - África)



Tata Kiretauã (masc.) diz-nos, num artigo que escreveu e publicou no seu blog Cultura e tradição Kongo – ngola-bantu[41], sob o título "Akua Ukulu – Culto aos Antepassados" que, tal culto não só se encontra atestado nas tradições do Povo Bantu, como também é, actualment, praticado entre esse mesmo Povo.



Para melhor o compreendermos procurarei sintetizar a sua explicação, dividindo-a em cinco diferentes secções ou alíneas (a, b, c, d, e).
a)- Existência do culto prestado aos mortos:
A Comemoração e Culto dos Mortos, encontra-se atestada na cultura Bantu, como uma tradição muito arraigada nesse povo. Nessa tradição não só se acredita que os MUKULU (ancestrais genealógicos) devem ser comemorados e reverenciados, mas também que os “seus espíritos continuam a habitar a aldeia como se vivos estivessem e que por serem reverenciados, se sentem felizes, e os seus TSHIPUPU (fantasmas ou aparições) não surgirão para causar transtornos àqueles que ainda permanecem encarnados. A sua Comemoração é chamada: Kimenga.
b)- Local do culto:
Esse culto é prestado, normalmente, "quase que invariavelmente na parte mais posterior das aldeias, isto é, mais ao fundo, onde em suas KUBATA recebem seus JIMBENGE (assentamentos) que são feitos em troncos rituais secos, que são enterrados no chão…".
c)- Objectos oferecidos:
Os objectos mais comuns são pós, substâncias sagrados (Mafu), folhas (Jinsaba), favas (Jinimo), cascas secas de determinadas árvores que servem de culto às divindades, sacrifícios de animais, que são colocados nos seus JIMBENGE (…) os troncos rituais recebem uma roupagem colorida, são adornados com pequenas cabaças (Jimbinda) e na parte superior do tronco é fixada uma peneira de palha (Oropemba) com a parte côncava voltada para baixo, sendo esta Oropemba também enfeitada com pequenas cabaças que podem ser pintadas com tintas vegetais.
d)- Diferenças nos rituais
Os rituais variam conforme a pessoa defunta que é comemorada. Por exemplo: quando se quer comemorar o espírito (Mukisi//Nkisi) de um sacerdote ou de uma sacerdotisa falecidos, a sua “divindade” será alojada num compartimento denominado NZO KALUNGANGOMBE, e como esse falecido ou falecida era cabeça da casa respectiva, isto é, os seus donos, as suas “divindades” passam a receber o título de MUKISI MUKIDIADIME (divindade mais velha), recebendo reverências e tratamentos idênticos aos demais Minkisi.
Quando se trata de pessoas que, em vida, colaboraram para o desenvolvimento da aldeia, tiveram grande elo de amizade, realizaram grandes ou bons feitos, além daquelas que possuíram grau de parentesco consanguíneo ou não, devem ser reverenciadas dentro do culto, sendo obedecido um sistema hierárquico:
Em primeiro lugar, serão o SOBA, o MULOJI (Rei) ou o feiticeiro, pois que zelaram pelo bem-estar dos aldeões;
De seguida, os KUBAMA, NTABI, NGANGA A NGOMBO, MUZAMBU, isto é, os Sacerdotes dos oráculos que prestaram bons serviços em prol da aldeia;
Depois serão os MUKURUNTU, ou seja, os Espíritos dos curandeiros que zelaram pela saúde comunitária, tanto física como espiritual do povo;
Finalmente, vêm os Espíritos das pessoas anciãs e sábias que, de modo geral, contribuíram para o bem-estar da aldeia.
e)- Aparição dos espíritos dessas pessoas:
Durante a prestação do Culto aos Antepassados pode suceder que, às vezes, "apareçam" os seus espíritos de forma materializada (MUKU, plural JIMUKU). Se esses espíritos pertencem a pessoas defuntas do sexo feminino, então usam-se máscaras denominadas de MWANA PWO; mas se os espíritos pertencem a pessoas do sexo masculino as máscaras recebem o nome de MUKANGE. O uso da máscara é para demonstrar que os seus rostos nunca mais poderão ser vistos pelos vivos.
13- Conclusão geral
Pelo exposto sobre o culto aos mortos dos antepassados em diferentes povos e em várias culturas, ainda que de modo muito sucinto, podemos deduzir quatro ideias mestras, a saber que:
1ª- A tradição comemorativa dos Nossos Defuntos se encontra muito arraigada nas várias culturas e nos diferentes povos;
2ª- Se enraíza num profundo sentimento religioso e místico;
3ª- Esse culto prestado é a manifestação materializada, não só de um verdadeiro respeito, mas também de uma recordação da presença que é sentida como actual e contínua entre nós, seus familiares, amigos e conhecidos;
4ª- Esse mesmo sentimento parece ter acompanhado a Humanidade, quer no tempo, quer no espaço.

Notas




[1]Leis de Manu, I, 95; III, 82, 122, 127, 146, 189, 274.
[2][On line] [Consult 16-10-2011] Disponível em: http://www.historiadomundo.com.br/chinesa/religiao-chinesa.htm. e ainda em: http://ebooksbrasil.org/eLibris/cidadeantiga.html#A2 Esse culto tributado aos mortos exprimia-se em grego pelas palavras enaghízo, enaghismós. Pólux, VIII, 91; Heródoto, I, 167, Aristides, 21; Catão, 15; Pausânias, IX, 13, 3. A palavra enaghízo empregava-se para os sacrifícios oferecidos aos mortos; thyo, para os que se ofereciam aos deuses do céu; essa diferença é bem acentuada por Pausânias, II, 10, 1, e pelo escoliastes de Eurípides, Feníc., 281. Cf. Plutarco, Quest. rom., 34.
[3] [On line] [Consult 15-10-2011] Disponível em: http://tradidiquodaccepi.blogspot.com/2009/03/la-ofrenda-los-muertos-y-su-origen.html e ainda em http://cpantiguidade.com/2009/12/17/a-morte-e-a-religiao-na-grecia-antiga/
[4] [On line] [Consult 27-10-2011] Disponível em: http://principiologia.blogs.sapo.pt/1669.html
[5] [On line] [Consult 27-10-2011] Disponível em: http://faustomoraesjr.sites.uol.com.br/grega1.htm
[6] [On line] [Consult 15-10-2011] Disponível em: http//tradidiquodaccepi.blogspot.com/2009/03/la-ofrenda-los-muertos-y-su-origen.html.
[7] Palavra vinda do grego Γαῖα, Gaîa (possivelmente a contracção de γῆ, gê, "terra" e αἶα, aîa, "mãe", "terra-mãe") ou Gé (γῆ, gê, "terra"),
[8] A tragédia ΛΚΗΣΤΙΣ — Alceste — é, a um tempo, o mais antigo drama de Eurípedes que sobreviveu e o único anterior à Guerra do Peloponeso. A distância entre Aceste e As filhas de Pélias, sua primeira tragédia, é de quase 20 anos; trata-se, indubitavelmente, da obra de um poeta experiente e maduro.
A peça foi apresentada em Atenas nas Dionísias Urbanas[1] de -438 e fazia parte de uma tetralogia, na qual ocupava o quarto lugar, habitualmente reservado aos dramas satíricos. As outras peças eram As Cretenses, Álcmeon em Psófis e Télefo[2]. A tetralogia de Eurípedes foi classificada em segundo lugar, e o primeiro lugar coube a Sófocles.(http://greciantiga.org/arquivo.asp?num=0229).
[9] Eurípides, Alcestes, 1015.
[10] Alberto González:: La Ofrenda a los Muertos y su Origen Pagano. [On line] [Consult 26-10-2011] Disponível em: http://tradidiquodaccepi.blogspot.com/2009/03/la-ofrenda-los-muertos-y-su-origen.html.
[11] Ovídio, Fast., II, 518. Virgílio, En., VI 379. — Comparar com o grego hiláskomai (Pausânias, VI, 6, 8). — Tito Lívio, 1, 20.
[12] ) É possível que o sentido primitivo de héros tenha sido o de homem morto. A linguagem das inscrições, que é a do vulgo, e que é ao mesmo tempo a em que o antigo sentido das palavras se conserva por mais tempo, usa às vezes héros com o mesmo significado de defunto, Boeckh, Corp. ínscr., n.°s 1629, 1723, 1781, 1782, 1784, 1786, 1789, 3398; F. Lebas, Monum. de Moréia, p. 205. Vide Teógnis, ed. Welcker, v. 513, e Pausânias, VI, 6, 9. — Os tebanos usavam uma antiga expressão para significar morrer: héroa ghénes-thai (Aristóteles, Fragmentos, ed. Heitz, t. IV, p. 260; Cf. Plutarco, Proverb. quibus Alex. usi sunt. c. 47). — Os gregos também davam à alma do morto o nome de dáimon. — Eurípides, Alceste, 1140 e Escoliastes. Ésquilo, Persas, 620. Pausânias, VI, 6.
[13] Tito Lívio, III, 58. Virgílio, VI, 119; X, 534; III, 303. Orelli, n.°s 4440, 4441, 4447, 4459, etc. Tito Lívio, III, 19.
[14] Apuleus, De deo Socratis. Sérvio, ad Aeneid., III, 63.
[15] Censorinus, De die natali, 3. Cícero, Timeu, 11. — Dionísio de Halicarnasso traduz lar familiaris por Kat’ okían héros (Antiq. rom., IV, 2).
[16] Cícero, Timeu, 11. — Dionísio de Halicarnasso traduz lar familiaris por Kat’ okían héros (Antiq. rom., IV, 2).
[17] Vide em Heródoto, I, 167, a história das almas dos Fócios (Da cidade de Foceia (grego antigo Φώκαια,Phôkaia) era uma cidade grega da Ásia Menor, onde actualmente se encontra a cidade de Foça ou Eskifoça, no golfo de Esmirna na Turquia ) que assustaram a toda uma região, até que lhes celebraram o aniversário da morte, e vários heróis semelhantes em Heródoto e Pausânias, VI, 6, 7. Do mesmo modo, em Ésquilo, Clitemnestra, advertida de que os manes de Agamenon estão irritados contra ela, apressa-se em mandar alimentos a seu túmulo. Vide também a lenda romana narrada por Ovídio, Fastos, II, 549-556: “Esqueceram-se, um dia, do dever das parentalia, e as almas saíram dos túmulos, e viram-nas correr, gritando pelas ruas da cidade e pelos campos do Lácio, até que ofereceram sacrifícios em seus túmulos.” — Cf. a história que nos conta ainda Plínio, o Jovem, VII, 27.
[18][On line] [Consult 13-10-2011] Disponível em: http://www.ribeirodasilva.pro.br/direitoromanoarcaico-parte1-04.html
[19] Plutarco, Sólon, 21.
[20] Aristóteles, citado por Plutarco, Quest. rom., 52; grecq., 5. Ésquilo, Coéf., 475.
[21] Eurípides, Fenic., 1321. Odisseia., X, 526. Ésquilo, Coéforas., 475: Coéforas “Ó bem-aventurados, que habitais debaixo da terra, ouvi minha invocação; vinde em socorro de vossos filhos, e dai-lhes a vitória.” — É em virtude dessa ideia que Virgílio chama ao pai morto de Sancte parens, divinus parens: Virgílio., En., V, 30; V, 47. Plutarco, Quest. rom., 14. Cornélio Nepos, Fragm., XII.
[22] Cícero, De legibus, II, 22.
[23] Santo Agostinho, Cidade de Deus, VIII, 26, IX, 11.
[24]Cícero, De leg., II, 9. — Varrão, em Santo Agostinho, Cidade de Deus, VIII, 26.
[25] Virgilio, En., IV, 34..
[26] Eurípides, Troyanas, 96; Electra, 505-510. Virgílio, En.. VI, 177; III, 63, 305; V. 48. — O gramático Nónio Marcelo diz que os antigos chamavam ao sepulcro de templo; e, com efeito, Virgílio emprega o vocábulo templum para designar o túmulo ou cenotáfio que Dido constrói para seu esposo (Eneida, IV, 457). — Plutarco, Quest. rom.,
[27] [On line] [Consult 15-10-2011] Disponível em: http://iberiaeterna.blogspot.com/2008/05/altares-domsticos.html
[28] [On line] [Consult 16-10-2011] Disponível em: http://www.bbc.co.uk/religion/religions/shinto/beliefs/kami_1.shtml.
[29] [On line] [Consult 16-10-2011] Disponível em http://www.abhr.org.br/plura/ojs/index.php/anais/article/view/172/120.
[30] Viveu entre 551-479/8 (a. C.), na mesma época sensivelmente em que na Grécia, Ésquilo e Sócrates propagavam um humanismo ético que viria a ter grande influência nas filosofias morais, políticas e sociais da China e os profetas hebreus e Ageu (522 a486 a.C) e Zacarias (520 e 475), Malaquias e Neemias (cerca de Neemias cerca do ano 450 a.C.). encorajavam os judeus a retornar a Jerusalém, após o exílio Asiro-bebilónico.
[31] Tão-Teh-King, 49:2
[32] Idem, 63:2
[33] Soares, 1964, p. 1183.
[34] Analecta, 14:36.
[35] [On line] [Consult 30-10-2011] Disponível em: http://br2.mofcom.gov.cn/aarticle/aboutchina/publicholiday/200512/20051200995308.html
[36] http://www.comunidadeespirita.com.br/religioes/5%20confucionismo.htm.
[37] [On line] [Consult 14-10-2011] Disponível em: http://www.terra.com.br/revistaplaneta/mat_398.htm
[38]. Ibidem e ainda em (http://www.terra.com.br/revistaplaneta/mat_398.htm)
[39] [On line] [Consult 14-10-2011] Disponível em: http://www.mulherdeclasse.com.br/Historia%20das%20regilioes.htm.
[40] [On line] [Consult 14-10-2011] Disponível em: http://www.terra.com.br/revistaplaneta/mat_398.htm.
[41] [On line] [Consult 14-10-2011] Disponível em: http://tatakiretaua.blogspot.com/2009/02/akua-ukulu-culto-aos-antepassados.html.

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